terça-feira, 16 de novembro de 2010

“Difícil não é começar, difícil é recomeçar”



“Difícil não é começar, difícil é recomeçar”. Li esta frase hoje, escrita em um quadro negro, em um dos lugares onde eu trabalho. Deixou-me pensativa. Ora, as coisas acabam. Tudo que tem um começo tem também um fim. Só o que tem fim é que pressupõe um recomeço. Aquilo que é infinito não pode ter um começo.

Diariamente vemos pessoas sofrendo com o final das coisas. Finais de relacionamentos, finais de histórias, finais de dia, finais. Espera-se ansiosamente pelo último capítulo da novela, pela última página do livro, pelo último dia de trabalho na empresa, pelo último dia de aula. Mas não pelo último beijo. Não pelo último brinde. Não pelo último afago. Não pela última palavra. Não pelo último dia de vida.

Todos sabemos que vamos morrer, basta estar vivo para isso, diz o clichê. Mas a vida se tornaria insuportável se não nos “esquecêssemos” disso. Justifico o uso das aspas. Não se esquece que vai morrer. Ninguém em são consciência coloca-se em uma situação de risco, porque esquece que pode morrer. Não nos jogamos da janela porque esquecemos que somos mortais.

Mas por outro lado, sim, esquecemos que podemos morrer. Acreditamos sermos imortais. É o tal do “isso não acontece comigo”. E não é só com a morte. O fulano faz sexo sem camisinha, duvidando de que pode mesmo pegar uma doença venérea. A fulana engravida, duvidando de que o seu corpo poderia gerar uma criança. O outro dirige depois de beber um bocado, pensando que vai ter sorte e chegar em casa sem nenhum arranhão. A outra cai no golpe do bilhete premiado achando que é esperta. E assim a vida segue.

A vida está sempre nos lembrando de que as coisas têm um final, de que não somos imortais, de que não somos super-heróis, de que não temos super poderes. E nós não cansamos de não aprender. Por quê?

Em Psicanálise, chama-se de recalque esse esquecimento que coloco entre aspas. A vida seria insuportável se tivéssemos consciência, o tempo todo, da morte. Quem suportaria falar cada palavra, pensando que poderia ser a última? Alguém seria forte o suficiente para dar o último beijo em cada beijo? Quão doído seria sair de casa para ir ao trabalho? Quão doído seria deixar os filhos na escola? Quem poderia dormir? É preciso recalcar a morte.

Por outro lado....suportaríamos a eternidade? E se vivêssemos para sempre? Quanto dura o “para sempre”? O eterno é simplesmente isso; eterno. Ausência de tempo, ausência de medo, ausência de riscos. Pode parecer confortável a uma primeira vista, mas certamente seria tão insuportável quanto se lembrar da morte o tempo todo. É como no filme “O diário de um vampiro”, em que o personagem principal diz que a eternidade é a sua maldição. Ou, ainda, Fred Mercure, que canta: “Who wants to live forever?”

Somos incapazes de valorizar as coisas das quais temos certeza. Não podemos amar as coisas das quais temos certeza. A certeza ofusca, deixa as coisas sem brilho. Seja a certeza de viver ou de morrer. Queixamos-nos da falta de garantias que a vida nos proporciona. Mas queixamos-nos de tantas coisas que amamos! Reclama-se da falta de liberdade que há nos relacionamentos, mas não se vive sem eles! (Cabe aí relacionamento com mãe, namorado, esposa, filho, etc) Queixamos-nos do outro, mas não podemos viver sozinhos.

Só podemos viver na condição de amar. Só podemos amar na condição de duvidar. Só podemos duvidar na condição de desejar. Desejar ser amado, desejar amar, desejar crescer, desejar viver, desejar realizar, desejar desejar.

“Difícil não é começar, difícil é recomeçar”, dizia a frase. O recomeço acontece depois de uma decepção. Depois que a vida nos frustra, nos lembra de que não há garantias, de que não estamos completamente seguros em lugar nenhum na vida. Seja um lugar de espaço físico (em casa, na rua, no shopping), ou em espaço como posição (namorada, marido, noiva). A vida vem, nos lembra da nossa finitude, e aí é preciso um recomeço. Frequentemente escuto pessoas dizerem que suas vidas melhoram depois disso. Que passaram a valorizar o seu tempo, a sua vida, depois de levar uma “rasteira” da vida; ou da morte. Há portadores de HIV que juram que a sua vida melhorou depois de saber do vírus. Dizem que passaram a viver, ao invés de apenas sobreviver.

Talvez porque sabendo da efemeridade das coisas, pode-se aproveitá-las. Sabendo da incerteza de cada momento, podemos vivê-los. Podemos passar de espectadores, a atores.

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Imagem: Net

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